Via fluvial permanece

(Foto: perolanews.com.br)

A Hidrovia Paraguai-Paraná parte de Cáceres, cidade mato-grossense que faz fronteira com a Bolívia, distante 214 quilômetros da capital, Cuiabá, ladeia o Mato Grosso do Sul, passa pelo Paraguai, Argentina, e chega ao porto de Neuva Palmira, no Uruguai, um percurso de 3,442 quilômetros. Segundo a Administração da Hidrovia do Paraguai (Ahipart), em 2013 foram transportados pela via 6 bilhões de toneladas de mercadoria, basicamente minério de ferro, partindo das imediações de Corumbá, já no Mato Grosso do Sul. Operadores logísticos e produtores rurais sul-mato-grossenses avaliam, porém, que a via é subutilizada. “Poderíamos transportar 7 milhões de toneladas de soja por ano pela hidrovia, desafogando a hidrovia e os portos brasileiros, mas não há infraestrutura que dê suporte a essa operação”, diz Cláudio Antônio Cavol, presidente do sindicato das Empresas de Transporte de Carga e Logística (Setlog).
O Ministério do Transporte apresentou em 2013 um Plano Hidroviário Estratégico (PHE), como qual pretende ampliar o transporte de hidrovias no país com o investimento de R$17 bilhões até 2024. Os estudos que batizam o programa, realizados pela consultoria Arcades Logos, detectaram que a hidrovia Paraguai-Paraná tem potencial para transportar 24,4 milhões de toneladas anuais de mercadoria provenientes do Brasil em 2031. O plano estratégico prevê investimentos de R$2,3 bilhões até 2024 para melhorar a estrutura física do trecho brasileiro de hidrovia.
Entre as obras previstas estão a dragagem, a regularização do leito do rio Paraguai entre Cáceres e Corumbá, na cidade sul-mato-grossense, as duas pontes que cruzam o rio Paraguai em direção a Bolivia, uma rodoviária e outra ferroviária – a Eurico Gaspar Dutra, classificada como patrimônio histórico nacional-, precisam passar por intervenções para o alargamento de seus vãos. Além disso, as curvas acentuadas do rio em direção a Porto Murtinho, no sudoeste do Mato Grosso do Sul, precisam ser retificados para gerar maior fluidez.
O ministério, porém, não estabeleceu nenhum cronograma para a realização dessas intervenções. Benfeitorias na Hidrovia Paraguai-Paraná também não constam na relação de prioridades do governo federal estabelecida no Programa de Investimentos em Logística (PIL), elaborado pela Empresa de Planejamento de Logística (EPL), nem do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC2), no qual a programação de inverti mento na hidrovia apenas a realização de estudos de viabilidade de obra, mas sem prazo de execução.
Como diz o secretário de Obras Públicas e Transporte de Mato Grosso do Sul, Edson Giroto, qualquer intervenção de porte no rio Paraguai exige um cuidado relatório de impacto ambiental e, mesmo assim, pode sofrer atrasas por questionamento da justiça, O rio Paraguai e seus afluentes compõem o bioma do Pantanal, o que amplia intenção da opinião pública sobre as intervenções que influenciam o fluxo das aguas. A preocupação é que o aprofundamento do rio e a ratificação de trechos para facilitar o trânsito de barcaças possam aceleram a vazão da água, comprometendo o bioma.
Giroto defende que o governo federal concentre-se, num primeiro momento, em gerar viabilidade para o escoamento da produção a partir de Porto Murtinho, ou do porto de Concepción, no Paraguai, situado a 600 quilômetro a jusante, a partir de onde o rio é mais caudaloso e apresenta um calado superior a 10 metros na maior parte do ano, garantindo a navegabilidade das barcaças mesmo no período de estiagem sem necessidade de grandes intervenções, Cavol, do Setlog, diz que Concepcíon está a menos de 400 quilômetros de importantes cidades produtoras de grãos da região centro-sul do estado, sendo uma alternativa tanto para o escoamento de safra como rota potencial para importação de fertilizantes.
Em fevereiro, Giroto, Cavol e Eduardo Ridel, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), acompanharam o governador do estado, André Puccinelli (PMDB), em um encontro com o presidente paraguaio, Horácio Cartes, os brasileiros ouviram que o Paraguai tem disposição de conceder a operação do porto Concepcíon para iniciativa privada, sem restrição para a participação de estrangeiros.
Cavol afirma que há interesse por parte de empresários logísticos brasileiros na operação, mas dificilmente haverá investimento no país vizinho sem uma chancela do governo brasileiro. “ O presidente Cartes se demonstra amigável ao setor privado, mas investimentos em um terminal portuário são de longo prazo e precisamos de um acordo bilateral entre garantindo a segurança jurídica do empreendimento nos próximos governos”, diz. Giroto relata que o assunto tem sido tema de conversas com o governador Puccinelli e o governo federal. Porto Murtinho, que movimentou cargas de soja no passado, não apresenta condições operacionais adequadas no momento, segundo Cavol, e precisaria de investimentos de US$15 milhões  para tornar-se uma alternativa para o agro negócio. O governo do Estado tenta convencer os concessionários privados a realizar o investimento.
É bem diferente da realidade vivida pelos usuários sul-mato-grossenses da Hidrovia Tietê-Paraná, como as indústrias de Três Lagoas, na divisa com São Paulo, a chamada “rainha da celulose”, que unidades de Fibria, a maior produtora global de celulose de eucalipto; da Eldorado, que mantém no município a maior fábrica de produção contínua do mundo; e a maior fabrica de papel da International Paper. Os governos federais e do estado de São Paulo programaram investir R$1 bilhão para ampliar a capacidade do transporte de carga da hidrovia para 11 milhões de toneladas em 2020.
As obras todas em território paulista, onde a hidrovia se estende por 800 quilômetros, contemplam a implantação das eclusas da Penha, da Anhembi, Conchas e Santa Maria da Serra, a ampliação e retificação dos canais de Botucatu e Conchas e a implantação de um terminal portuário em Araçatuba. O governo de São Paulo também solicitou o licenciamento ambiental para a construção de uma barragem que permitira um prolongamento da hidrovia até Piracicaba.
A navegação da Hidrovia Tietê- Paraná ocorre a partir de São Simão, em Goiás, e se estende por 2,4 mil quilômetros, atende produtores rurais de Minas Gerais e Mato Grasso, antes de chegar no Mato Grosso do Sul, onde o primeiro porto é em Aparecida do Tabuado. Além de celulose, a hidrovia transporta soja, farelo de soja, cana, milho e areia. Segundo Giroto, a prefeitura de Três Lagoas planeja a construção de um porto fluvial na região de Cascalheiras, para o embarque de madeira, papel, produtos siderúrgicos, contêineres e ureia da futura fábrica de fertilizantes que a Petrobras pretende instalar no município.

Por Domingos Zaparolli

Fonte: Revista Valor Econômico