À procura de rotas alternativas

(Foto: bahiaeconimica.com.br)

A BR163, que corta o país de forma longitudinal, atravessa o Mato Grosso do Sul de Sonora, na divisa com Mato Grosso, até Mundo Novo, fronteira com o Paraná, e exerce um papel central na economia do Estado. Por ela trafega por volta de 80% dos grãos produzidos no Centro-Oeste, a principal fonte de riqueza da região, tendo como principais destinos os portos de Paranaguá (PR) e Santos (SP). Por conta disso, é chamada de “rodovia da soja”. Mas os sul-mato-grossenses se referem a ela também pelo sinistro apelido de “rodovia da morte”. É uma via estreita pista simples a maior parte do tempo, por onde trafegam sete mil veículos por dia, sendo 4,5mil caminhões numa velocidade média de 45 quilômetros por hora. “É uma via de alto risco, com registro diário de 15 acidentes, sendo entre seis e sete graves ou gravíssimos”, diz Claudio Antônio Cavol, presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de cargas e Logistica de Mato Grosso do Sul (Setlog MS).
A CCR, empresa que conquistou em leilão no fim de 2013º direito de explorar os 847 quilômetros da BR 163 no Estado, assumiu o compromisso de duplicar esse trecho rodoviário em cinco anos. Os operadores logísticos veem a duplicação com alivio e apreensão. Cavol diz que a obra irá gerar mais segurança, reduzir custos de manutenção e o tempo médio de viagem. Por outro lado, o pedágio estabelecido no leilão de privatização, de R$4,38 por eixo a cada 100 quilômetros, irá aumentar em 6% o custo da viagem. Uma moderna carreta de grãos de nove eixos, capaz de transportar 38 toneladas, pagará R$354,78 para trafegar entre Sonora e Mundo Novo. Na conta de Cavol. Só haveria equilíbrio entre os benefícios e os novos custos com uma tarifa de R$2,62 a cada 100 quilômetros.

A produção agrícola responde por 93% da carga sul-mato-grossense com destino a outros Estados. A Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul) estima que os produtores do Estado colherão 13,6 milhões de toneladas de soja e milho na safra 2013/2014. Partindo de Dourados, uma das principais regiões produtoras de grãos, localizada no sul do Estado, é preciso percorrer 940 quilômetros até Paranaguá (PR). Segundo o Setlog, o frete custa R$160,00 por tonelada. Um produtor em Illinois, no centro-oeste americano, gasta U$25,00 para transportar sua produção até o porto marítimo. “Quando os preços internacionais de grãos são bons, como nos últimos anos, o alto custo do transporte afeta nosso lucro e a capacidade de investir. Mas em um ano com preços ruins, representará prejuízo”, diz Eduardo Riedel, presidente da Famasul. “Não podemos ser dependentes da BR163 para escoar a produção, precisamos contar com um conjunto variado de opções logísticas.”

Edson Giroto, secretário estadual de Obras Públicas e Transporte, diz que o governo André Puccinelli (PMDB), estabeleceu em 2007 um planejamento de oito anos para a expansão da malha rodoviária do Estado, mas reconhece que as obras não serão suficientes para atender à demanda por infraestrutura dos produtores. “Estamos melhorando a interligação entre municípios, mas precisamos de ferrovias e hidrovias que levem nossos produtos aos portos “Obras com a ligação da Ferrovia Norte-Sul entre Panorama (SP) e Porto Murtinho (MS), onde poderia ser feita a conexão com a Hidrovia do Paraguai, que precisa de benfeitorias, ou a ligação pela Ferroeste entre Maracaju, no sul do Estado, e Cascavel, no Paraná, viabilizando acesso ferroviário ao porto de Paranaguá. “São intervenções de grande porte, que dependem da ação do governo federal.”
O programa rodoviário do governo estadual prevê investimentos de R$3 bilhões entre recursos próprios e do governo federal para a construção ou reforma de seis rodovias com grande apelo econômico. Duas estão concluídas: a pavimentação, sob responsabilidade do Estado, da BR 359, entre Coxim e Costa Rica, na divisa com Mato Grosso e Goiás, rota de grãos e pecuária, e a MS436, no norte do Estado, que liga Camapuã, Figueirão e Alcinópolis. Está em execução, com previsão de conclusão ainda em 2014, a pavimentação da MS 040, entre Campo Grande e Santa Rita do Pardo, rota de insumos como eucalipto e carvão vegetal para as indústrias de Tres Lagoas, que também serão abastecidas pelos insumos, principalmente borracha, que serão transportadas pela MS 112, que esta sendo pavimentada desde Cassilândia, no leste do Estado. O governo estadual recebeu aval das autoridades federais para a pavimentação da BR 419, que interligará a BR 163, em Rio Verde, até Aquidauana, na região do Pantanal. Os dois governos negociam o asfalto da MS 382, entre Bonito e a Serra da Bodoquena.
A busca por novas rotas para escoamento da produção levou a Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul (Fiems) e a Famasul, em parceria com outras federações de indústrias e agrícolas do Centro-Oeste, a encomendarem à consultoria Macrologística um diagnóstico logístico da região e propostas de investimentos. O estudo batizado de Centro-Oeste Competitivo concluiu que sem investimentos a região chegará em 2020 com 23 modais de transporte em situação crítica e as despesas logísticas anuais, que em 2011 somaram R$31,6 bilhões, saltarão para R$60,9 bilhões.
O trabalho também concluiu que seria necessário um investimento de R$159 bilhões até 2020 para dotar a região de infraestrutura adequada. Mas o investimento de R$36,4 bilhões em um conjunto de 106 obras, em dez corredores logísticos integrados, seria capaz de reduzir os gastos anuais com transporte em R$7,2 bilhões e evitar a situação do gargalo crítico nos principais modais logísticos. “Foram escolhidas as obras com a melhor relação custo-benefício. Em média, é possível obter o retorno dos investimentos em cinco anos”, diz Renato Pavan, sócio-diretor da Macrologística.
Ele diz que para Mato Grosso do Sul as obras prioritárias são principalmente ferroviárias. Entre elas estão a construção de trechos ferroviários entre Maracaju e o Porto de Paranaguá. A extensão da Ferrovia Norte-sul até Estrela d’Oeste, em São Paulo, e depois até o Porto de Santos. E a adequação da ferrovia Corumbá- Santos, de propriedade da América Latina Logistica (ALL), que precisará ter sua capacidade ampliada para dar fluxo ao escoamento da produção mineral e do polo gás-químico planejado para Corumbá. Hoje o trecho ferroviário entre Corumbá e Campo Grande, comporta 8,4 mil toneladas diárias. Entre Campo Grande e Três Lagoas, na divisa com São Paulo, a capacidade é de 12 mil toneladas, quando a demanda em 2020 nos dois trechos será de 69 mil toneladas por dia. Outra obra é a Hidrovia Paraguai- Paraná, uma rota fluvial capaz de conectar o Centro-Oeste aos portos marítimos do Uruguai e Argentina, mas que é subutilizada.
Sérgio Marcolino Longen, presidente da Fiems, diz que as obras propostas do projeto Centro- Oeste Competitivo são atrativas para investidores privados e podem ser viabilizadas por meio de Parcerias Público Privadas (PPPs). “Estamos apresentando o projeto para investidores de outros Estados e até mesmo para estrangeiros e a aceitação tem sido muito positiva.” Mas ele afirma que falta o governo federal sinalizar quais obras pretende realizar sozinho, em quais quer a participação da iniciativa privada e oferecer regras claras e segurança jurídica nos contratos”.
Claudio Cavol, do Setlog, se mostra cético em relação a grandes obras que dependem do governo federal, Os operadores logísticos sul-mato-grossenses optaram por buscar alternativas. Em setembro de 2013, o Setlog organizou uma caravana formada por 90 empresários e políticos para verificar in loco as condições de uma rota de escoamento da produção de grãos pelo Pacifico, porque os países asiáticos são o destino de 77% da soja produzida no Centro-Oeste. Partindo de Campo Grande, passando por Corumbá, Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, cruzando os Andes até chegar ao porto de Iquique, no Chile, são 2470 quilômetros, o dobro da distancia do porto de Paranaguá. A vantagem seria encurtar a distancia em cinco mil quilômetros marítimos, ou 12 dias de navegação até a China, além da agilidade operacional do porto chileno. A ideia esbarrou na burocracia aduaneira, são necessários cinco dias para entrar na Bolívia e mais um para entrar no Chile, e na baixa qualidade da rodovia entre Santa Cruz de la Sierra e a divisa com o Chile, região de travessia dos Andes.
Os operadores logísticos não desanimaram. Agora, estudam uma rota pelo Paraguai de 1,5mil quilômetros até o Chile. O problema é que 450 quilômetros do percurso não são asfaltados e seria necessário construir uma ponte sobre o Rio Paraguai, ligando o Estado ao país vizinho. Em fevereiro, o governador André Puccinelli e empresários foram recebidos em Assunção pelo presidente Horacio Cartes. Segundo Cavol, o presidente paraguaio demonstrou interesse no corredor logístico, mas para realizar as obras necessitaria de ajuda do poder público brasileiro. Pelo Pacífico ou pelo Atlântico, as alternativas para escoar a produção passam pelas ações do governo federal.

Por Domingos Zaparolli

Fonte: Revista Valor Econômico