Apesar da derrota inicial sofrida pelo governo do Estado na Assembleia Legislativa, que rejeitou votar em regime de urgência projeto de lei estabelecendo aumento das alíquotas do ICMS para bens supérfluos, impostos sobre heranças e alteração das regras para o IPVA, o contribuinte sul-mato-grossense deve se preparar para o inevitável aumento da carga tributária, mesmo que reduzida em relação à proposta inicial encaminhada pelo Poder Executivo. Isso porque, na avaliação de alguns advogados ouvidos pelo Jornal Correio do Estado, a atual gestão decidiu escolher “o caminho mais fácil” para aumentar receita e equilibrar as despesas.
O governo recorreu à alta de impostos, mesmo expediente utilizado pelo governo Dilma, apesar de ter ao menos dois elementos para virar o jogo em seu favor – os cofres reforçados recentemente com o montante de R$ 1,419 bilhão, proveniente dos depósitos judiciais; e cortes de gastos, a regra clássica de todo administrador. O advogado constitucionalista André Borges se diz “bastante surpreso com a iniciativa do governador, que, até este momento, vinha dando bons exemplos de administração eficiente e cuidadosa”. Ele avalia que os projetos de lei estadual para aumentar a tributação são uma saída administrativa equivocada, que define como inacreditável e inaceitável. “Inacreditável porque é o que todos estão a fazer, de maneira errada: o aumento da carga tributária, em vez da concentração no trabalho duro de cortar despesas e investimentos, até que a situação melhore; inaceitável porque certamente muitos de seus eleitores estão contrariados com a decisão, por se tratarem de contribuintes que pagam impostos em demasia”. Borges defende que o Executivo invista em contenção de gastos para elevar o caixa, entre elas redução de comissionados, de secretarias e investimentos de forma emergencial. “Sempre há excessos onde é possível cortar, mas não aumentando ainda mais a carga tributária”, conclui.
O aumento da carga tributária à população sul-matogrossense ocorre menos de três semanas após o governo do Estado ser amparado pela publicação de lei complementar, que autorizou a transferência aos cofres públicos de MS de R$ 1,41 bilhão, correspondentes a 70% dos depósitos judiciais (usados para o pagamento de precatórios). Este montante, conforme reconheceu nesta semana o próprio governo, aliviará as contas estaduais, permitindo a reserva para o 13º do funcionalismo e pagamentos diversos. “Mesmo com a liberação desta fonte de recursos, o governo do Estado insiste em aumentar impostos”, frisa. Analisando a questão constitucional, o advogado tributário Vladimir Rossi Lourenço explica que é de competência do Estado aumentar ou reduzir tributos para manter o caixa. Ele, porém, pontua que, mais do que uma medida de ajuste fiscal das contas públicas, o projeto de lei mexerá no bolso do contribuinte em uma época de crise para todos. “A gente sabe que tanto Estado quanto União e município estão tentando aumentar a receita com os impostos, mas, como cidadão, é lamentável isso.
Ninguém está aguentando mais pagar impostos”, ressalta. O advogado tributário Alexandre Bastos, no entanto, acredita que a ação do governo estadual é temporária e reflexo da redução de repasses da União para estados e municípios. “Vários estados estão tendo de fazer seus ajustes para amenizar a falta de repasses federais. Cada um fará o que puder. São medidas paliativas”, analisa. Ele afirma que a sociedade está sofrendo o reflexo de uma crise “fomentada pela União”. Em relação à elevação do tributo para produtos supérfluos, ele avalia que o Estado está utilizando uma área do direito tributário que prevê a majoração de alguns segmentos, que não são de primeira necessidade, para garantir a manutenção do caixa.
Ajustes
Anteontem, diante da reação negativa à proposta, o governo do Estado iniciou estudos para fazer correções ao projeto, que deverão ser apresentados aos deputados entre hoje e amanhã. Entre as alterações que podem ser introduzidas, analisa Borges, está a redução do porcentual do aumento das alíquotas, além da exclusão do projeto de algumas situações, como a própria isenção do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA). Na proposta que não encontrou consenso entre os parlamentares, a isenção para veículos que hoje vale a partir de 15 anos será estendida para 20 anos. Também pode ser aumentada a margem de isenção do Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCD), estabelecida no texto inicial em R$ 30 mil. A Assembleia Legislativa vetou o regime de urgência, o que proporcionará um debate maior em torno do projeto. Borges, porém, destaca que como a base de apoio do governador é amplamente majoritária na Casa, é remota a possibilidade de que ao entrar em votação, a proposta seja rejeitada pelos parlamentares. Alexandre Bastos ainda ressalta que cabe à Casa de Leis, por meio da Comissão de Constituição, Justiça e Redação, analisar se as alterações respeitam a legislação.
Fonte: Correio do Estado