Piora do cenário econômico e aumento da inadimplência fizeram aumentar os pedidos de recuperação judicial de empresas em Campo Grande neste ano, considerado o mais alto para o período em 10 anos. De acordo com dados da Vara de Falências, Recuperações, Insolvências e Cumprimento de Cartas Precatórias em Geral, somente em 2015 foram propostas sete novas ações de recuperação judicial na Capital, o equivalente a 41% de todos os 17 processos recebidos pela Justiça desde 2005, quando passou a vigorar a nova Lei de Falências, que instituiu o instrumento jurídico de recuperação judicial no lugar da antiga concordata. “A recuperação judicial é um instituto que veio com a Lei 11.101, de 2005. De uma maneira simples, a recuperação de empresa nada mais é do que um fôlego que é dado para essa empresa a fim de que tenha condições de se recuperar.
Nos anos de 2005, 2006 até 2012, não foram muitas as empresas que entraram com o pedido, depois lentamente os pedidos foram aumentando. Realmente esse foi o ano que o número cresceu muito, justamente em razão da crise econômica. As empresas começaram a passar por inúmeras dificuldades, a crise afetou todos os segmentos”, avalia o juiz da Vara de Falências, Recuperações e Insolvências, José Henrique Neiva de Carvalho e Silva. Conforme o magistrado, os valores das dívidas ajuizadas nos processos de recuperação judicial variam de R$ 300 mil a R$ 400 milhões e os segmentos das empresas são variados. “Há construtoras, farmácias, lojas que vendem todo tipo de produto, siderúrgicas, ramo de combustíveis, frigoríficos, algumas transportadoras também estão em recuperação. Qualquer empresa pode pedir, desde que ela preencha os requisitos legais”, explicou
Diferenças
Diferentemente dos processos de falência — estes, esclarece, “são para as empresas que realmente não têm condições de se recuperar, então é feita a arrecadação dos bens dessa empresa falida, e com o produto da venda desses bens, são pagos os credores” — na recuperação judicial a empresa apresenta um plano de recuperação, que será apreciado numa assembleia geral, votado por todas as classes de credo- res e havendo aprovação, esse plano vai ser cumprido. Normalmente há um abatimento dos valores e um parcelamento dos débitos. “É importante salientar que no caso da falência os sócios perdem administração. Na empresa falida, é o síndico que vai arrecadar os bens para que sejam vendidos depois. No caso da recuperação da empresa, não. A gestão da empresa continua com os sócios, a empresa continua funcionando normalmente, mas é nomeado um administrador que vai analisar as questões do processo e fiscalizar também a contabilidade da empresa.
Quem presta contas é a própria empresa, ela tem obrigação de prestar contas mensalmente (à Justiça). O administrador tem obrigação, também, de mensalmente dizer a atuação da empresa, como a empresa está indo, se as atividades estão em andamento normalmente, se a empresa está conseguindo cumprir as metas”, esclareceu. O prazo para recuperação é diferenciado e pode variar de acordo com cada processo, mas a lei estabelece período de até dois anos. “Cada empresa tem o seu ramo de atividade, alguns ramos passam por períodos sazonais, outros tem períodos em que aumenta a venda dos produtos, em outros diminui, então cada recuperação tem as suas características próprias”, analisa. Conforme o juiz José Henrique Silva, um dos principais entraves para o processo é a não sujeição dos créditos bancários ao plano de recuperação judicial, estabelecida pela própria Lei de Falências, mas decisões em primeira e segunda instância vem revertendo esse cenário de forma favorável às empresas em MS. “O mecânico que consertou o motor de um caminhão de uma transportadora; os fornecedores de remédios para as farmácias; os restaurantes que fornecem alimentação para os funcionários de uma empresa; todos esses credores devem se submeter a recuperação judicial, vai haver uma diminuição dos valores que eles teriam direito a receber e os créditos são parcelados, ao passo que os bancários não; eles recebem tudo e de imediato.
Eu não me conformei com essa situação e entendi que esse privilégio é inconstitucional, porque a Constituição diz primeiro que todos são iguais, há uma isonomia; segundo, que essa nova lei de recuperação de empresas foi implantada com fim social, para manter os salários, empregos e a empresa funcionando, com recolhimento de impostos e tudo o mais que a empresa, em funcionamento, favorece”, comentou. Outras decisões, inclusive no STJ, já vinham nesse sentido e, em alguns pontos, já havia jurisprudência, com relação a bens indispensáveis para a atividade da empresa. “Em todos eles eu tenho incluído os créditos bancários e o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, em alguns pontos, como por exemplo a questão da trava bancária, tem incluído o crédito bancário na recuperação, excluindo o que é chamado de trava bancária. O TJ daqui tem sido pioneiro também nessa questão”, informou.
Fonte: Correio do Estado